domingo, 2 de julho de 2017

Quando o oprimido se torna o opressor

O que é mais triste no meu dia a dia, é quando eu vejo preconceito sendo institucionalizado dentro da comunidade LGBT. Isso só prova o quanto nós ainda temos que aprender mais sobre a pluralidade LGBT. Informação é o antídoto para o preconceito. Então que eu possa fazer esse blog cumprir seu papel de desconstruidor de conceitos e permitam-me compartilhar o pouco que penso sobre tudo isso.

Na sociedade em que vivemos (patriarcal), os papeis de gênero são muito bem delimitados e condizentes com a cultura machista perpetuada por séculos até hoje. Homens e mulheres recebem, desde o nascimento, obrigações, deveres, direitos e favores devido ao gênero ao qual pertencem. Gênero esse que é delimitado por apenas um fator biológico: o órgão genital com o qual nasceram. Mas essa delimitação de tarefas e papéis baseados em gênero, trouxe também opressão e discriminação baseadas. Há muito pano pra manga na discussão de gênero e é importante que essa discussão seja levada para a escola e também os lares. Porém, ainda não estamos vivendo esse momento no Brasil. Então tentamos usar a internet como espaço democrático que é para discussões e trazer mais consciência para as pessoas.


Afeminofobia presente nos aplicativos gays: "Gosto dos meus homens como
meus dentes: alinhados (não afeminados) e brancos. (...)
O que trago hoje é um pensamento balizado pela aversão ao feminino. Afeminofobia é um termo utilizado para referir-se à aversão a gays afeminados. Aqueles homens homossexuais que não agem de acordo com papéis de gênero estabelecidos pela sociedade heteronormativa. Isso se reflete em estatísticas bem expressivas. O site Gay Times publicou um estudo que revela que mais da metade dos gays não afeminados (57%) acham que seus colegas afeminados dão uma reputação ruim ao coletivo homossexual masculino. O relatório, assinado por Cal Strode, entrevistou 280 gays do Reino Unido e Califórnia e comparou as opiniões dos que se autodenominavam straight-acting (não afeminados) com o resto. Os dados mostraram conclusões importantes entre o coletivo straight: esses sofreram 33% a menos de episódios de homofobia na escola do que seus companheiros afeminados e 35% deles concordavam com essa afirmação: “Eu me identifico mais com a comunidade heterossexual do que com a gay”. 


Afeminofobia nas redes sociais


A heteronormatividade é responsável pela perpetuação da ideia de que o aceitável para um homem é que ele adote comportamentos e pensamentos condizentes com seu órgão sexual. Assim, a afeminofobia se faz presente quando há o desprezo por aqueles que não cumprem seus papéis de gênero (pré) determinados por uma sociedade machista. Hoje vivemos num mundo que olha o feminino com olhar chauvinista e misógino. O feminino é visto como algo inferior quando comparado ao masculino. Então essa afeminofobia está mais em destaque hoje por ser bem mais visível. Mas é tão antiga quanto o machismo.

Com a acensão de aplicativos de relacionamentos gays, como o Grindr e até mesmo o próprio Tinder (que não é necessariamente gay porém serve ao mesmo propósito), o usuário tem a liberdade de colocar em seu perfil o que procura num parceiro. É muito comum ver usuários de Grindr, por exemplo, exigindo que seus supostos futuros parceiros não sejam afeminados. Além disso, o problema reside no fato de que muitos desses homens não afeminados fazem questão de usar palavras do vocabulário hétero, como se fosse um tipo de máscara linguística que usam para tentar passar a impressão de que não são homossexuais. Tudo uma tentativa frustrada de encaixar-se em padrões reforçados pelo machismo e que prejudicam e não ajudam em nada a comunidade LGBT e demais pessoas da sociedade, sejam elas hétero ou homossexuais.


Um problema de todos

A afeminofobia não afeta somente os LGBT. Mas é algo que afeta a todas as pessoas. Diz respeito tanto à lésbica masculinizada quanto ao transsexual. A heteronormatividade impõe regras de comportamento tanto a LGBTs quanto a heterossexuais, sejam eles homens ou mulheres. Homens que usam cabelo comprido e brincos podem ser tão discriminados quanto mulheres que usam uma gravata ou suspensório. O relatório Abrazar a diversidade, elaborado pelo Instituto da Mulher em 2015, mostra que 20% dos estudantes espanhóis foram testemunhas de agressões homofóbicas e transfóbicas nos colégios. Uma violência que não ocorre somente contra meninos e meninas que manifestaram sua orientação sexual, mas contra aqueles que unicamente apresentam comportamentos próprios do outro sexo. O problema não é culpa unicamente de homens gays que perpetuam esse preconceito. A mídia tem uma parcela grande da culpa ao representar em seu conteúdo de entretenimento, personagens gays afeminados caricaturados, que servem única e exclusivamente para proporcionar humor, geralmente pautado por estereótipos preconceituosos e totalmente distorcidos de realidade. 

A misoginia também é culpada por perpetuar o feminino como algo que deve ser usado como objeto. Gays femininos são colocados no mesmo espectro que travestis, transgêneros e drag queens como performances objetificadas e usadas somente para o prazer de um pagante. Sendo assim, prejudica a maneira como os afeminados são vistos e respeitados na sociedade. Quando o oprimido se torna o opressor e há uma troca nos pólos do processo intimidador/intimidado, a luta se torna mais difícil e árdua, pois inclui metas de desconstruir também vários LGBTs.



sexta-feira, 16 de junho de 2017

Nunca doar 100%

O título dessa publicação foi dado por uma amiga tão sábia que poderia ser membro do conselho Jedi. Real oficial!

Ela é sagitariana e sabe tudo sobre não se prender a ninguém. Se o mundo fosse uma gaiola, ela já o teria destruído e ido passear pelo universo. Às vezes imagino que se ela pudesse, o faria.
Eu sou uma canceriana que gosta de estar junto, abraçar, conchinha. Ela prefere cada um jogado no seu canto na cama.
Eu gosto da ideia de casamento, ela gosta da ideia de "não sou de nignuém, eu sou de todo mundo e todo mundo me quer bem".
Eu gosto de Backstreet Boys, Paulo Ricardo e Beatles.
Ela gosta de sertanejo sofrência.
Ela sofre sendo feliz.
Eu sou feliz sofrendo...
Mas de alguma forma inesperada, num desses videokes da cidade, o universo nos juntou e temos uma bela amizade desde então. Deus me trouxe nela um poço de sabedoria e conselhos que, quando eu tiver a coragem de seguir, serei mais feliz. O problema é que eu quero prender e ela pede para eu soltar.

A pessoa que vos escreve acredita no amor, cresceu com os desenhos que falam em "final feliz" e sonha um dia encontrar alguém para si. O maior ensinamento de todos esses gurus do amor é que todos nós temos que deixar que o universo traga, sem forçar nada. Quando chega, não podemos nos prender. Que coisa mais difícil e confusa para uma canceriana! Preciso soltar, relaxar, deixar ir pra que possa chegar. Quando chega, eu não posso prender. Tenho que deixar ali no canto dele, acreditando que é meu e que se for realmente pra ser... será.

Minha amiga sagitariana tiraria isso de letra. Afinal, é o signo mais independente do zodíaco. Mas eu, pobre canceriana desprovida de prática para o desprender, acho isso a coisa mais horrível do mundo.

Aparentemente, quando eu me desprendo e não ligo, não mando mensagem, não pergunto se dormiu bem, me sinto uma pessoa fria e totalmente diferente. Me sinto uma pessoa horrível. Sinto que devo mostrar os sentimentos porque a vida é tão pequena, curta e deve ser vivida em seu mais intenso significado. Eu grito, esperneio e falo mesmo que gosto. Mas fazendo isso, afasto, expulso, assusto.
Nada é perfeito, não é verdade?

O grande conselho da sagitariana, nunca doar 100%, desaparece do meu HD emocional quando fico com alguém. E por mais que eu tenha tomado a decisão, bem antes, de não me apaixonar... Eu me apego. Todos os conselhos são em vão e eu faço aquele famoso papel de trouxa novamente. Parece até um círculo vicioso.

Mas a grande questão é essa: Devo deixar de amar por causa disso? Deixar de ser quem eu sou em essência só pra me moldar do jeito doentio como as pessoas se tratam hoje em dia? Será que eu devo agir como todo mundo e transformar o meu coração num canto tão frio a ponto de Elza se sentir em casa?

Não penso que deve ser assim. Vou continuar sendo como eu sou. Vou continuar amando sim e se for pra sofrer que pelo menos seja por algo que me completou em um momento. Acredito que o significado de amar-se seja isso... Doar quem você é não porque não quer se preservar, mas porque sabe a pessoa maravilhosa que é e adoraria compartilhar isso com alguém. Se a pessoa não quer ou não está em condições de te ter, bola pra frente. Porque assim como até então você vivia bem sem aquela pessoa na sua vida, você viverá bem sem ela daquele ponto em diante.

Que possamos demonstrar sempre o que sentimos e pensamos.
As pessoas precisam disso.
O mundo precisa disso.
Acredito que principalmente os que não acreditam mais no amor precisam disso.

sexta-feira, 28 de abril de 2017

Machismo (lésbico) de cada dia...

Um dia, em algum tweet da vida, eu li a seguinte afirmação: "Ninguém nasce desconstruído, só Lego".

Achei lindo, achei o máximo e adotei pra mim. Até porque eu estou em processo de desconstrução profunda desde que me assumi como mulher lésbica. Ainda estou processando muitas informações e conceitos, mas vamos lá... Crescendo sempre. No momento em que comecei essa nova postagem, estava ouvindo Bon Jovi, mas depois coloquei Karol Conka e MC Carol, pra dar aquela inspirada. Sabe coisa de quem vai pra academia ouvindo Sia com David Guetta? Pois é... Música ajuda muito no momento.

Eu cresci com exemplo de mulheres guerreiras perto de mim. Mulheres que fizeram a diferença. Mulheres que pegam no batente. Mulheres de atitude. Minha mãe a maior delas. Todos esses exemplos me ajudaram a construir desde pequena a noção (obrigada mãe por esse grande conselho), de que eu deveria estudar para "não depender de homem algum" quando ficasse adulta. Quando criança eu não entendia o verdadeiro motivo de tal conselho. Hoje com quase 30 anos de existência (quase nenhum de experiência), eu posso dizer que sim, infelizmente eu entendo direitinho o porquê desse conselho. E procuro aqui explicar esse porque.

Começando pelo óbvio. Vivemos SIM numa sociedade machista. Isso não é novo. Porém, está tão enraizado em nossa sociedade (e, porque não, em nós?), que até mesmo em relações lésbicas (ISSO MESMO), vemos esse machismo sendo reproduzido. Relações onde deveriam have duas MULHERES exercendo seus papéis conforme os ditames de sua própria identidade de gênero, vemos várias delas reforçando em seus papéis ou de suas companheiras, esse machismo nosso de cada dia. Um machismo que contamina até mesmo membros da comunidade LGBT, que é a que mais sofre com machismo e heteronormatividade.

Mas primeiro eu quero explicar o conceito de heteronormatividade e depois falar um pouco do machismo. Um é consequência do outro e um está contido no outro. 

HETERONORMATIVIDADE 

Vários autores, estudiosos, teóricos e cientistas sociais tentaram teorizar e problematizar o conceito por trás da ideia de heteronormatividade. Muito se tem falado sobre ela e pouco se tem discutido (em âmbito mundial) sobre os seus efeitos nas vidas tanto de LGBTs quanto de heterossexuais. Em suma, a heteronormatividade pode ser definida como práticas e instituições que legitimam e privilegiam a heterossexualidade e relacionamentos heterossexuais como fundamentais e 'naturais' dentro da sociedade". 

Assim sendo, podemos estabelecer certos comportamentos de lésbicas como heteronormativos, ao passo que indicam uma certa preferência por papéis de gêneros bem exemplificados na relação através de uma divisão clara de comportamentos entre as duas companheiras. Exemplos claros seriam a lésbica masculinizada que se comporta como o gênero masculino na relação enquanto lê sua companheira como o gênero feminino. A lésbica masculina (conhecida como Butch, Caminhão, Bofinho), que prefere lésbicas femininas (conhecidas como Femme, Lady), porque esse tipo de relacionamento pode afirmar o papel de homem e mulher, mesmo que biologicamente falando, a relação seja entre duas mulheres. 

Aqui estamos falando do imagético. Falamos do que se lê e não do que se é. Pelo olhar atual de nossa sociedade, ao vermos uma lésbica masculina já tachamos em nossa mente que aquela mulher é a parte ativa na relação. E isso vai muito além do sexo: pode ser ativa por ser a que trabalha, a que toma a frente, a que decide tudo, que, em nossa mente, adota o papel do homem. Isso tudo se dá porque a definição que temos de masculino e feminino é pautada pela heteronormatividade. Em nossa mente, homem e mulher tem seus papéis bem definidos dentro da sociedade e suas instituições. Papéis esses que reforçam conceitos machistas de que mulheres e homens devem ter comportamentos diferentes e que para uns certos comportamentos são tolerados e para outros, outros tipos de comportamentos são censurados. 

MACHISMO

Machismo é um conceito que está dentro do conceito de heteronormatividade. baseia-se na supervalorização das características físicas e culturais associadas com o sexo masculino, em detrimento daquelas associadas ao sexo feminino, pela crença de que homens são superiores às mulheres. Só com essa definição fica claro que é um conceito que já está enraizado em nossa sociedade há muito tempo. Por isso fica tão difícil erradicá-lo, ou senão, amenizá-lo do nosso convívio. E não são somente homens que reproduzem discursos e comportamentos machistas. Mulheres tanto heterossexuais quanto as homossexuais reproduzem sim o machismo no dia a dia e isso é muito triste. Somente desmascarando, apontando, discutindo e problematizando, podemos tirar isso de nós. Assim teremos uma convivência mais harmoniosa com todos e poderemos respeitar mais a nós mesmas como mulheres. 

O machismo está presente sim nas relações lésbicas ao mesmo tempo em que está a heteronormatividade. O pensamento de que a figura feminina na relação deve se ater às tarefas domésticas e cuidar dos filhos é uma forma de reproduzir o machismo. Também o pensamento de que deve haver um "homem" na relação. A ideia de que uma das parceiras deve se comportar como a figura masculinizada que provê segurança, toma a frente, tem a iniciativa... São muitas maneiras e elas legitimam no casal o que a sociedade já vem querendo nos ensinar. De que as relações são saudáveis quando existe patriarcado, mesmo que esse patriarcado seja praticado por uma mulher reproduzindo e espelhando a masculinidade. 

CONCLUSÃO

Os papeis de feminino e masculino são construções binárias de uma sociedade há muito tempo heteronormativa que desde nosso nascimento dita nossos gostos, comportamentos, papéis na sociedade, tudo ligado ao órgão sexual com o qual nós nascemos. Mas saindo um pouco da caixinha, podemos repensar e desconstruir essa noção e concentrar nossos esforços e não estereotipar ninguém com base em um simples fato biológico, que não deve ser parâmetro para balizar o jeito que ninguém vai viver sua vida. Principalmente numa relação lésbica, onde a desconstrução deve sim ser uma constante. Lutar contra o machismo dentro da comunidade LGBT deve ser o ponto de partida, para depois lutarmos contra o machismo na sociedade como um todo. Somos nós as quem devemos parar de reproduzir conceitos machistas, mesmo que velados e pequenos. Assim, estaremos um passo mais perto de concretizar uma sociedade mais justa e igualitária para todos. 

sábado, 18 de fevereiro de 2017

Saber

Saber, não por vagas expressões de afeto
Não por tácitos olhares inquietos
Mas por toque e carícia
Por deleites e delícias
Que disparam meu coração
e bombeiam meu sangue em profusão

Saber, não por sabedoria humana
Bom senso da psicologia
Ou compatibilidade da astrologia
Mas por beijos molhados
Corpos suados
Que vivenciam a paixão
E fazem do vagabundo, rei, do príncipe, um pobretão

Saber, o que é mistério
Solucionar o desconhecido critério
Necessário para te conquistar
e te deixar aqui ao meu lado
mesmo que seja cedo ou errado
Mas sendo, já me satisfaz
E existindo a recíproca já me leva em paz

Crendices não fazem mais sentido
meus preconceitos foram atingidos
Desmoralizados pelo teu sorriso
Se vai durar eu não sei
Mas pensar em você me trouxe palavras
Necessárias para criar essas rimas
Agora essa é a minha sina
Esperar o teu sinal
Me confirmando se o sentimento é igual.