domingo, 18 de outubro de 2015

Votar nulo ou não votar, eis a questão

A opção do eleitor em anular o voto deve ser respeitada como escolha legítima e não tratada como descaso do cidadão

 Montagem sobre imagem
 
Raisa Marcondes
De quatro em quatro anos os brasileiros saem de suas casas em direção às milhares de urnas espalhadas por todo o país para escolher o próximo chefe de Estado, que estará no comando por mais quatro anos. A escolha é importante e é, além de uma obrigação, o exercício da cidadania ao qual todas as pessoas têm direito.

Porém, nem tudo é fácil. Assim como há os que já sabem em quem votar, há os que já sabem em quem não votar. É aí que entra o voto nulo. No segundo turno eleitoral deste ano, de acordo com o portal de notícias G1, a porcentagem de votos nulos foi de 4,40%, o que equivale 4,6 milhões de brasileiros. Mas, pelas pesquisas eleitorais, esses votos são contados como não-válidos.

Porém, até quando um voto nulo pode ser considerado como não válido? O voto nulo é, realmente, o não exercício da cidadania? Ou será que se pode pensar no voto nulo como um grito (modesto) de um povo descontente com a atual situação política do país?

Pouco tempo antes do segundo turno das eleições 2010, Plínio Arruda, candidato à presidência pelo PSOL (Partido Socialismo e Liberdade), por meio do serviço twittcam, veio a público pedir aos brasileiros que exercessem a cidadania e escolhessem não escolher.

Como cidadão, o brasileiro tem esse direito, sim. Há que se fazer uma reflexão e pensar: “Votar pelo ‘menos pior’ ou anular?”. O direito à escolha é precioso e dá ao Brasil a condição de país democrático. Porém, há que se pensar que votando nulo não se deixa de exercer a cidadania. Aliás, ao votar nulo e escolher não votar em nenhum candidato, mostra-se o descontentamento com a situação política. Escolher não escolher é escolher votar pela mudança. O povo brasileiro pode votar nulo sem se preocupar com a “falta” do exercício da democracia. Ela, a democracia, se faz quando votamos com consciência. Sem pensar no “menos pior” ou no que “rouba mas faz”. Votar com consciência é votar sabendo que tal candidato fará o que é melhor para o país. Votar consciente talvez, em alguns casos, possa significar votar nulo. Se for, que o brasileiro possa realmente exercer a cidadania e escolher não escolher para que a insatisfação possa ser notada e, quem sabe, ouvida.

Na noite maringaense, elas são rainhas

As drag queens levam uma vida quase normal; durante o dia, têm um emprego comum mas quando chega a noite, transformam-se

 Imagem/João Paulo Dantas 
 A drag Fervera Tiger fica cerca de duas horas se produzindo
João Paulo Dantas
A noite GLS (gays, lésbicas e simpatizantes) de Maringá conta com inúmeros atrativos, com músicas animadas, que embalam o ritmo da festa. Mas o verdadeiro show fica por conta das drag queens, que fazem performances com o objetivo de animar ainda mais o público. Nesses locais, o preconceito não está presente, brigas são raras e a diversão vem acima de tudo.

Durante a noite elas são impecáveis: maquiagem carregada e perucas exóticas. Desfilam pela noite maringaense com orgulho da valorização que recebem no ambiente de trabalho. “Eu não me sinto importante, sou importante, meu amor. Me produzo durante horas, todos me notam”, afirma Fervera Tiger, 33. É evidente o quanto Tiger considera importante ser, no mínimo, conhecida - isso é comum no mundo das drag queens, afinal, quanto mais amadas e valorizadas pelo público que as assiste, mais elas se sentem motivadas. “A meu ver, o que leva a drag queen a querer trabalhar com isso é a valorização. Só pelo fato de ser conhecida, de sempre ser elogiada.

Como são bonitas, como parecem mulheres, isso tudo as motiva ainda mais”, explica Camila Telles, 24, psicóloga especialista em terapia comportamental, ela diz ainda que muitas vezes a drag começam “por influência da família, que pode ter mimado muito a criança, ou quando ela foi criada muito próxima a uma garota”.

Aliás, Shalanna Mitchell, 24, mostra à reportagem do Matéria Prima o quanto realmente é valorizada, como Telles afirma. “Quem quiser saber mais sobre mim, acessa o Google e digita lá: Shalanna Mitchell. Acho isso muito chique e digno, sinal que sou importante. Lá vocês vão achar muita coisa sobre mim”, diz a drag, sempre bem humorada.

Essas “rainhas” da noite levam uma vida quase normal. Durante o dia, têm um trabalho comum, mas é só até a noite chegar, quando, então, assumem outra identidade. É o caso de Mitchell, que durante o dia é cabeleireiro e atende pelo nome de Marcos Galdino. “Sou maquiador e trabalho para agência de modelos e publicidade, fazendo catálogos”, conta. O nome exótico veio de uma antiga top model, que abrilhantou as passarelas nas décadas de 1970 e 1980. “Achava super digna, ela tinha tudo a ver comigo”, explica.

A realização dessas performances nas boates gays maringaenses muitas vezes é o diferencial do local, já que nem todos os ambientes GLS da cidade contam com a realização de shows com as drags. “É um trabalho super criativo e ousado, com muito glamour. Acho fundamental as casas noturnas GLS terem shows de drag queens, pois a festa fica mais colorida e divertida, destacando o local”, diz Willian Jackson, 27, promoter.


Alegria e preconceito não existem juntos


Simpatizantes da causa aderem ao movimento homossexual para mostrar aceitação, apoio e principalmente para divertir


Raisa Marcondes
Em Maringá, o número de simpatizantes da causa gay é grande. São heterossexuais que fazem questão de mostrar seu apoio e, principalmente, aceitação aos homossexuais que, apesar disso, ainda hoje sofrem preconceito.

O crescimento dessa aprovação é notado principalmente nas baladas GLS (gays, lésbicas e simpatizantes), que ocorrem todo fim de semana em várias boates na noite maringaense. Ali, as pessoas não querem saber quem é gay ou simpatizante. A diversão fala mais alto e toma conta. O entretenimento serve como forma de auto-afirmação e é um jeito de “jogar tudo para o ar’’.

J.G., 25, bissexual, professor, diz acreditar que o público também serve como atrativo para as baladas GLS. “É um lugar mais tranquilo. Raramente você vê briga ou violência de qualquer tipo. A música é bem melhor. O público é mais calmo e organizado. Diferente de baladas em que dá todo o tipo de gente’’, diz. Ele afirma ainda que heterossexuais que frequentam balada GLS sofrem tanto preconceito quanto homossexuais. “É difícil para uma pessoa entender que alguém vai para uma balada GLS somente se divertir’’, conta.

C.C., 26, professora, heterossexual, conta que o que a atraiu para a noite GLS foi a curiosidade. “Eu sempre quis saber como era. Só não gostei porque não tinha muitos heterossexuais bonitos’’, brinca. Ela diz também que se sente mais à vontade nas noites GLS. “Eu me soltei muito mais. Numa balada tradicional você fica mais recatado, com vergonha de ser quem você realmente é’’, afirma.

Lourdes Mozango, 43, psicóloga especializada em relacionamentos, diz que o crescimento do número de simpatizantes da causa se deve ao fato de que hoje o movimento gay é mais ouvido. “Nas paradas gays, em programas de TV, jornais e revistas nós somos constantemente lembrados de que os gays existem e que são um grupo ativo na sociedade. Essa aceitação é um sinal de que a sociedade está pronta para ouvi-los’’, diz.

Por outro lado, em Maringá a aceitação desse grupo fora das boates ainda é uma questão de tempo. “Nesses lugares as pessoas podem ser e mostrar quem são à vontade. Mas nossa cidade ainda tem um pensamento muito arcaico em relação a isso. Os maringaenses ainda não estão preparados para reconhecer os gays como pessoas que têm direitos e deveres como qualquer outros’’, diz a psicóloga.

Cinema é realizado por paixão à arte

Maringá desenvolve produções cinematográficas de qualidade, provando que talento não se resume ao eixo Rio-São Paulo

 Imagem/Cibele Chacon
 Produções nacionais ainda são pequena parcela do cinema
Cibele Chacon
A Retomada do Cinema Nacional se deu no pós-governo Collor, marcada pela produção do filme “Carlota Joaquina, Princesa do Brasil” no ano de 1995. O longa evidenciou o início de grandes produções “tupiniquins”, inclusive, com o auxilio da Lei de Incentivo à Cultura, que já vigorava. Com isso, os filmes nacionais começaram a ser realizados não somente nos grandes centros, mas também no interior dos Estados, como é o caso de Maringá.

Mesmo com dificuldades financeiras e de aceitação do público, há quem faça cinema por amor à arte, como é o caso do publicitário e cineasta Eliton Oliveira, 32, cinéfilo desde criança. “A profissão de cineasta é marginalizada. A primeira coisa que as pessoas dizem é: ‘você vai conseguir ganhar dinheiro com isso?’ E eu respondo que não dá dinheiro, que não sobrevivo de cinema. Mas é uma coisa que eu não consigo deixar de fazer”, diz.

O cineasta, que havia feito diversos curtas, produz atualmente o primeiro longa-metragem, o documentário “23.11.1967: Documentos do Caso Clodimar Pedrosa Lô”, que é a compilação de depoimentos e manchetes de um episódio estarrecedor que chocou a cidade de Maringá pela maneira com que um jovem foi assassinado. E diz que hoje a cidade não tem estrutura para que um filme seja inteiramente realizado aqui, sem que seja necessário se deslocar a grandes centros para a finalização. “Meu sonho é transformar Maringá em um pequeno pólo de produção cinematográfica. Não será como São Paulo e Rio de Janeiro, mas, quem sabe, como Curitiba. Temos uma cidade muito bonita, que oferece muitos recursos visuais para um longa. Minha ideia é trazer profissionais de fora, para que quem está aqui possa aprender.”

Oliveira diz que o pensamento dos empresários não é de incentivar a cultura, e sim associar a marca a grandes produções. Essa é uma das maiores dificuldades para se conseguir financiar um projeto menor. “O que a gente mais ouve é não. A cada 50 empresas que a gente procura, uma ou duas se interessam em colocar dinheiro no projeto. As parcerias com empresas de comunicação é que ajudam a viabilizar o trabalho.”

Segundo o cineasta, o público que assiste a filmes nacionais é muito pequeno, apesar de estar crescendo nos últimos anos. “Para você colocar mil pessoas em uma sala de cinema para assistir a um filme brasileiro é muito difícil. Para você colocar 150 mil pessoas em um estádio de futebol para assistir a um jogo, é fácil. Mas é uma questão de cultura. O brasileiro não tem essa cultura do cinema, tem a do futebol”, afirma.


Para fãs, qualidade não falta ao Brasil


Cinéfilos divergem sobre a qualidade do cinema regional; para uns, está crescendo, outros afirmam que não


Raisa Marcondes
Cinéfilos e cineastas começam a voltar a atenção para a arte cinematográfica realizada dentro das fronteiras do país. Alguns deles, que residem em Maringá, concordam quando o assunto é a qualidade crescente dos filmes nacionais e regionais.

“Quando se trabalha com orçamento baixo, começa-se a priorizar os pontos fortes da produção que independem do patrocínio, como personagens mais densos, trama mais bem construída, e exige-se mais dos atores na atuação”, diz José Santos, 25, professor, quando indagado se considera de boa qualidade as produções regionais e nacionais.

O cinema regional sofre algum preconceito quando se põe em questão a qualidade técnica do filme, como conta Lucas Tascim, 18, secretário. “Eu não vejo muito cinema regional pela falta de interesse. A qualidade técnica não me atrai, não há muito apelo”, diz.

Cássia Conejo, 27, professora da Universidade Estadual de Maringá (UEM), diz acreditar que não há muita divulgação para o cinema regional, mas isso não interfere na qualidade técnica. “Não tem muito relevo. O filme estrangeiro você vê na mídia, o nacional é menos divulgado nos meios de comunicação de massa”, diz. Cássia afirma também que não consegue comparar o cinema regional com os alternativos americanos. “No caso de Pink Flamingos [1972, John Walters, EUA], por exemplo, o contexto histórico é diferente. Isso deve ser levado em conta quando comparado aos filmes daqui”, diz.

Para Renato Lemos, 23, professor de espanhol, a qualidade de atuação é bem diferente. “Minha preferência seria pelo internacional, pelo fato dos atores hollywoodianos serem mais experientes no que se refere ao cinema”, afirma. Ele ainda conta que isso não interfere na hora de assitir a um filme nacional, “Se for para assitir, eu assisto”, diz.

O estudante de direito Tiago Campanholi, 20, diz preferir o cinema internacional ao nacional, mas afirma que o nacional está evoluindo em qualidade. “Eles [cineastas brasileiros], estão parando de falar somente de sexo. As tramas estão mais profundas e complexas. Isso faz o filme ficar melhor”, diz.

Teatro transforma e forma profissionais

Em Maringá, muitos estudantes das artes cênicas têm as vidas modificadas em função da arte de entreter nos palcos 


 Imagem/Sandy Souza
  Falta de recurso e incentivo são as maiores dificuldades
Raisa Marcondes
Muitas pessoas em Maringá estudam teatro por vários motivos. Vencer a timidez, ingressar no mercado de trabalho como ator ou até mesmo se divertir. Mas essas pessoas, tanto alunos interessados na arte cênica, como professores que vivem dela, sabem que há certas dificuldades em fazer e viver do teatro em Maringá.

Uma dessas alunas é Elaine Teleken, 19, que foi apresentada ao teatro desde cedo: “Aos 10 anos fui presenteada com o livro do autor Ariano Saussuna, ‘O Auto da Compadecida’. Foi o suficiente para me motivar a querer conhecer o mundo do teatro. Passou a ser tudo para mim e estava decidida que queria muito continuar ’’, diz.

Como Elaine, outros alunos sentem que o teatro preenche uma necessidade que não encontram em outro lugar. Mario Costa, 26, é aluno há três anos e segundo ele mesmo, não encontra satisfação em outro lugar. “Eu faço porque é aqui que posso me comunicar e me expressar de maneira que eu me sinta confortável ’’, diz.

Mas a realidade não é tão boa para muitos. O professor Pedro Ochoa, integrante do Circo Teatro sem Lona de Maringá, diz que o teatro regional, para conseguir ter público, precisa ser divulgado. “Maringá pode, sim, dar valor ao teatro regional, mas desde que seja eficiente na divulgação”, diz.

As sociólogas Eliza Cazorlla e Mariana Galuch, ambas formada em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Maringá, dizem, em artigo redigido especialmente para a Redação do MP, que o maringaense está longe de se comparar com o londrinense em questão de identidade cultural. “Construir uma identidade cultural é um caminho lento e legitimar as artes como ferramenta para a educação é um passo inicial que facilitaria o fortalecimento dessa arte”, observa. Na opinião das duas, um curso de Artes Cênicas, na UEM, pode legitimizar e gerar reconhecimento por parte da população.

Segundo o professor Pedro Ochoa, com as várias oficinas que ocorrem na universidade e um curso nas Artes Cênicas sendo institucionalizado, ficaria mais fácil para o maringaense valorizar o regional, mas ainda falta apoio para que o teatro passe a ser visto como mais que mero instrumento de entretenimento e sim uma terapia tanto para o ator como para o público. “No teatro todos nós somos levados a ultrapassar nossos limites”, diz.


Arte auxilia na superação da timidez


Pessoas tímidas encontraram na arte da interpretação a forma de vencer a dificuldade de se relacionar


Camila Munhoz 
De acordo com Pedro Ochoa, integrante do Circo Teatro Sem Lona e professor da Oficina de Teatro da UEM (Universidade Estadual de Maringá), as artes cênicas ajudam muito na superação da timidez. “A timidez é uma característica da pessoa e o teatro é a superação dos seus limites”, afirma.

A estudante de psicologia Thalyta Zanin, 19, diz que o teatro a ajudou muito a superar a timidez de quando era criança. “Eu era incapaz de entrar em um lugar para comprar alguma coisa. Tinha vergonha de pedir um refrigerante. O teatro fez com que eu acreditasse mais em mim”, lembra.

Thalyta começou as aulas na escola, por volta dos 8 anos e hoje, aos 19, coordena um grupo de adolescentes em um colégio em Maringá. Segundo ela, alguns jovens têm dificuldade de “se soltar” durante a cena e às vezes precisam de um “empurrãozinho”. “O caso mais recente foi de um menino que durante os ensaios estava muito inseguro e inibido, mas na hora da apresentação surpreendeu a todos”, relata.

Eduardo Alves, 23, também começou a fazer teatro na escola. “Eu era tranquilão, na minha. Só conversava com o meu grupinho. O teatro me ajudou a quebrar a timidez.” Ele afirma ainda que o teatro foi importante para ele sobretudo na infância. “É a fase de construção da personalidade, depois você cresce e aprende a lidar melhor com as coisas.”

Há três anos, Alves participa de um grupo de teatro ligado à Igreja Católica, que frequentemente se apresenta em Maringá e em outras cidades do Estado. Por atuar junto à Igreja, o grupo de Eduardo tem público fiel, porém enfrenta as mesmas dificuldades dos grupos seculares: a falta de recursos e incentivo cultural.

Falta de formação se reflete na imprensa

A não obrigatoriedade do diploma de jornalista favoreceu ainda mais as empresas que já atuavam irregularmente 

 Imagem/Arquivo
 
Raisa Marcondes
Apesar de o Supremo Tribunal Federal ter considerado que o exercício profissional do jornalista não carece de formação superior na área, as principais empresas de comunicação estão mantendo em seus quadros, e contratando, apenas profissionais formados. Isso já era esperado porque assim como várias outras profissões em que o mesmo fenômeno é observado, como na publicidade, as próprias empresas sabem dos riscos que correm se optarem por equipes amadoras, que agem por instinto e sem nenhum preparo técnico.

Por outro lado,a não obrigatoriedade do diploma de jornalista favoreceu ainda mais aquelas empresas que já atuavam irregularmente no jornalismo. Infelizmente é a partir delas que continuamos nos deparando com péssimos exemplos do que a falta de preparo, aliada à exploração de mão de obra barata, é capaz de fazer com essa profissão na qual credibilidade deveria ser regra.

No município de Campo Mourão (distante 60 km de Maringá) há um jornal, de nome "Jornal Show", que se destina, ou pelo menos deveria, a notícias da cidade. Já na capa, na edição de julho, há uma confusão de cores e diagramação. As mais diversificadas publicidades tomam conta de mais de metade da página e não estão concentradas em um só ponto. Ao contrário disso, estão espalhadas por entre as notícias e nos mais diferentes tamanhos e cores. A capa do jornal faz juz ao nome e é um verdadeiro "show".

Além disso, há o problema de conteúdo do jornal, que parece mais um panfleto de época de eleições. Nas reportagens, pessoas públicas exageradamente elogiadas por seus feitos à comunidade. Observa-se também que as poucas notícias são postas de lado nas demais páginas do jornal, que vêm após os classificados.

Se a profissão não é valorizada hoje pelo brasileiro é porque a população, de certo modo, ainda confunde o jornalismo com essas publicações que empresários mal intencionados tentam apresentar como "jornais". A empresa jornalística deve pensar na seriedade que deseja, ou deveria desejar ter. Uma informação séria, livre e objetiva é o que as pessoas precisam.

No amadorismo, os conteúdos tornam-se prolixos e o leitor é desrespeitado no seu direito à informação. Qualquer pessoa pode aprender a escrever bem e dentro das normas de padronização adotadas pelos grandes jornais do Brasil. Qualquer profissional que possua bom vocabulário pode escrever um artigo e expor sua opinião. Qualquer pessoa pode fazer uma entrevista de cinco minutos com algumas perguntas simplórias. Nem por isso estará fazendo jornalismo nem observando as condutas, sobretudo éticas, desse profissional, moldado pelos debates acadêmicos e pela visão crítica que o jornalismo exige.

Consequências da falta de valorização

A educação no Brasil nunca esteve tão desvalorizada e parte disso é pelo não reconhecimento do trabalho dos professores



 Imagem/Raisa Marcondes
 No Brasil há falta de professores motivados com o trabalho
Raisa Marcondes
Desde a década de 1970, o professor brasileiro vem sofrendo desprestígio. Repetindo aqui palavras ditas no início deste ano ao Portal Terra por Roseli Souza, assessora pedagógica da divisão de sistemas de ensino de uma grande editora nacional, “naquela época ser professor era como ser médico, juiz ou padre”. Informações fundamentais e básicas, como o alfabeto, eram ensinadas por professores respeitados em todas as camadas sociais.

Contrapondo com essa valorização de outrora, a realidade de hoje vem mostrar a queda no número de professores no Brasil. De acordo com dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), a educação básica brasileira (que inclui a educação infantil, a especial, o ensino fundamental, o médio e a educação de jovens e adultos), em 2007 havia 2.500.554 professores em todo o território nacional. Dois anos depois, esse número caiu para 1.977.978.

Uma das causas é a desmotivação da categoria. Essa desmotivação inclui os baixos salários, a superlotação nas salas de aula e as péssimas instalações de trabalho nas quais os professores da rede pública são forçados a trabalhar. Uma dessas professoras é Amanda Gurgel, que ficou famosa no país inteiro a partir de um vídeo publicado no mês passado na internet. Nesse vídeo, Amanda discursa sobre as dificuldades do trabalho de professor público, em uma sessão da Secretaria de Educação de Natal. Mostra o mísero salário de R$ 970, reivindica ações mais eficazes do poder público e cobra respeito por parte dos governantes do estado do RN.

Essa realidade já não pode ser ignorada. Um país que não preza pela educação de seu povo está fadado ao subdesenvolvimento. O governo precisa abrir os olhos para o profissional que é, talvez, o mais importante na construção da cidadania. Deve haver redistribuição dos alunos na sala de aula, melhora nos salários de professores, como Amanda Gurgel, que precisam usar mais de dois ônibus para chegar ao trabalho, porque se compram um carro, não têm dinheiro para o combustível.

Deve-se investir na construção de mais escolas que possam absorver a demanda de alunos em condições que assegurem a todos a mesma qualidade na educação. O que falta para o professor brasileiro é motivação. Essa motivação deve partir de medidas que lhe dêem condições respeitáveis para, assim como um médico, um juiz ou até um padre, possam querer trilhar o caminho da docência.

Um país, como Monteiro Lobato dizia, constrói-se com livros e homens. De homens o Brasil está cheio, de livros também. Mas homens que possam lê-los, compreendê-los e construir ideias, isso está falta.

Erros comuns na escolha das reportagens

De acordo com as teorias do jornalismo, há que estabelecer um padrão correto na hora de hierarquizar as informações

Raisa Marcondes

Todo estudante de jornalismo sabe, ou deveria saber quais são os requisitos básicos para se estruturar uma reportagem. O uso correto dos verbos, das declarações da fonte e do volume de informações necessário para legitimar a reportagem. Isso deve estar aliado à noção de o quanto a reportagem impactará a vida das pessoas daquela região onde o jornal circula. A isso damos o nome de hierarquização da notícia.Na edição do dia 15 de junho, o “Diário do Norte do Paraná” traz um exemplo da falta de reflexão sobre a importância que deve se dar a essa hierarquia – entendida como algo que afeta o maior número de pessoas em uma comunidade. A reportagem da editoria Zoom, (página 3, considerada a mais importante do jornal), trouxe o seguinte título: “Com o dólar em baixa, viagens internacionais ganham fôlego”. A reportagem trata sobre como as classes A e B se beneficiam com a queda da moeda americana, quando o assunto é viajar. O material por si só não é problema, já que segundo Nelson Traquina, no livro “Teorias do Jornalismo”, o dinheiro e tudo o que mexe com o imaginário humano de consumo é considerado um valor-notícia. Mas o problema vai mais longe. Na mesma edição do jornal, na página 4, há outra reportagem com o seguinte título: “Atendimento a crianças e adolescentes cresce 110%”. O texto trata inteiramente do problema da droga que está ainda mais impregnada na vida dos adolescentes de Maringá.O problema da falta de hierarquização está justamente na localização e no espaço dedicado a cada uma das reportagens. Diferentemente da reportagem estampada na Zoom, o texto que trata da adolescência ocupa somente metade da página. Deveria ser uma reportagem mais explorada, por afetar todas as camadas sociais. Mas foi “ofuscado” por uma reportagem que, em princípio, interessa mais a quem tem maior poder aquisitivo e pode viajar mais. De acordo com o que se aprende nas faculdades de jornalismo, o procedimento correto na escolha de qual reportagem estampará a maior parte do jornal, deve se norteada por valores conhecidos como “valores-notícia”. São elementos presentes nas reportagens que vão dar uma idéia de como o assunto deve ser tratado e responde a certas perguntas: a quem interessará essa notícia? Quem será mais impactado? E quanta ênfase deve ser dada ao fato?Traquina lembra que os valores-notícia mais importantes são morte e proximidade. A reportagem que expõe a realidade da droga em Maringá está mais em conformidade com os valores notícias citados pelo estudioso do que a reportagem que trata das viagens ao exterior. Além de fugir da realidade da maioria dos maringaenses, a reportagem sobre as viagens não causa tanto impacto e reflexão quanto a do problema das drogas.Deve-se pensar melhor no destaque a ser dado a certas reportagens. A mídia não deve ter o papel de “mascarar” a realidade. Se há problemas na sociedade, devem ser expostos de maneira ponderada (para não virar sensacionalismo), mas sem que sejam colocados em segundo plano, beneficiando somente uma parte pequena da sociedade.

Viúvo tenta se despedir da companheira

Depois da morte da mulher, homem se desespera na busca por uma explicação e encontra conforto com os amigos

 Imagem/Raisa Marcondes 
“Os produtores de ‘Chico Xavier’ repetem, feito mantra, que não fizeram um filme espírita. ‘Tomei cuidado para que não fosse doutrinário’, diz o diretor Daniel Filho. ‘O filme, antes de qualquer denominação que possa segmentá-lo, é uma cinebiografia de uma das personalidades mais conhecidas e queridas dos brasileiros. Foi feito para ser visto por todos que gostam de uma belíssima história de vida’, emenda Carlos Eduardo Rodrigues, diretor da GloboFilmes.”Folha de S. Paulo, 26/02/2011
Raisa MarcondesEle acordou. Inconscientemente estendeu a mão para o lado esquerdo da cama. Encontrou somente um lugar vazio e um travesseiro já gasto. Suspirou e lembrou-se de que não estivera sonhando nos últimos anos. Lembrou-se de que a realidade da morte da mulher era tão tangível e já não podia ser mais negada. Era só uma questão de tempo até que as cicatrizes não doessem mais. Se é que era possível.
Procurou as respostas dentro de si mesmo. Será que havia sido um marido pouco amoroso? Será que a havia amado como merecia? Será que ela partiu sabendo que ele nunca a esqueceria? Será? Eram muitas as questões e nenhuma resposta.
Decidiu largar tudo. Seria bom recomeçar a vida em outra cidade. Escolheu um pequeno município no Estado de Minas Gerais, perto da capital. Ali, talvez, poderia esquecer o passado que lhe trazia tanta dor. Começou vida nova (pelo menos tentou), trabalhando no que mais gostava: a pintura. Conseguia um bom dinheiro vendendo suas obras, mas nada disso o fazia esquecer-se da dor de ser viúvo.
Um dia, no encontro da igreja para pessoas que perderam alguém amado, ele fez amizade com um senhor muito simpático que, como ele, havia perdido a mulher. Logo se entenderam e um partilhava do fardo do outro. O senhor, velhinho, atendia pelo apelido de Sócrates, pois havia mais sabedoria nele do que em todos os homens da cidade. Um dia, Sócrates disse algo que o homem nunca esqueceria:
- A vida é um eterno perde e ganha. Pessoas vão e pessoas vêm.- Eu só gostaria de ter ido no lugar dela – disse o viúvo, pesaroso.- Acho que isso não nos cabe decidir. Tudo o que nos cabe decidir é o que fazer com o tempo que nos é dado.
E assim passaram-se mais dois anos. Já tinha feito amizade com quase todas as pessoas da cidadezinha. Já tinha certa fama como pintor. Todos admiravam o seu trabalho, mas nem assim a tristeza ia embora completamente. Até que um dia a notícia que um amigo trazia lhe renovou a esperança:
- Dizem que esse tal de Chico fala com gente morta. Ele ouve e escreve as mensagens do além. Dona Célia jura que a carta que ela recebeu numa sessão com esse Chico é de autoria de seu filho. Parece que ele a chamou de um apelido que somente ele e ela conheciam.- Vai saber... Tem tanta gente enganadora nesse mundo.- Por que você não vai?- Com o Chico?- Isso mesmo. Você não tem nada a perder. Se ele realmente for que diz ser, você poderá encontrar algum consolo se souber que a sua mulher está bem.
Mas ele não queria ir. Apesar de o amigo ter insistido, achava que aquilo tudo era muita baboseira. Sabia que a mulher estava perdida e nada neste mundo a traria de volta. Mas mesmo assim ainda existia algo nele que ia e voltava. Uma vontade grande de saber, mas também medo de não conseguir nada.
Enquanto estava pintando um quadro novo, seu amigo veio bater a sua porta. Estava suado e ofegava. Com certeza tinha corrido e quando o homem foi lhe perguntar qual era o problema, o amigo começou a falar:
- Chico disse que essa é pra você! Ele me fez correr até aqui! Sabia seu nome, sua profissão e um monte de coisa sobre você – ele trazia na mão uma folha de papel amassada.- Muita gente na cidade sabe meu nome, onde moro e o que faço pra viver. Não é novidade pra ninguém.- Só leia, por favor.
Olhou para o papel e a vontade de ler era maior que o ceticismo. Pegou a carta do amigo, agradeceu e fechou a porta. Sentou-se no sofá e começou a analisar a carta. Seus olhos enchiam de lágrimas enquanto lia. Ao terminar, não conseguiu conter as lágrimas. Somente se concentrou na última parte da carta: 
“Eu sei que você me ama. Você me amou muito mais do que eu fui capaz de perceber. Sei que você não me esqueceu e que nunca me esquecerá. Eu vivo em você. Eu nunca te esqueci. Você vive em mim.” 
Se aquelas palavras eram realmente de sua mulher, não saberia nunca. Afinal de contas, ele era cético em relação a tudo que lhe dissesse que sua mulher estaria realmente viva em algum outro plano. Mas aquela carta, vinda de onde quer que fosse, o lembrou de algo que havia esquecido, ou talvez nunca houvesse notado: Ela vivia dentro dele. Enquanto a lembrança dela estivesse viva, ela nunca estaria morta. Pelo menos, não completamente.

Despreparo persiste no Matéria Prima

Ainda há o que melhorar no jornal-laboratório e a solução é o estudo permanente da língua e das técnicas jornalísticas


 Ilustração/Raisa Marcondes
 
Raisa Marcondes
O jornal Matéria Prima é um laboratório de textos. Isso significa que seus integrantes são jornalistas em formação e escrever quinzenalmente reportagens para o MP é uma forma de preparação e aprendizado. Há cada 15 dias, os textos originais são apresentados para revisão pela professora e somente após correção é que são publicados.

Mas mesmo com todas as semanas de correção que já se passaram, os "alunos repórteres" ainda não estão completamente preparados para assumir um lugar na redação de qualquer jornal. Aliás, muitos ainda cometem os mesmos erros de português, como crase e pontuação. Até a padronização (que permite que haja um modelo a ser seguido para escrever), tem deixado a desejar em certos casos.Dad Squarisi e Arlete Salvador, no livro “A arte de escrever bem”, dizem que o domínio do idioma e a capacidade de leitura são quesitos necessários para haver uma linguagem clara. Também dizem que uma frase elegante é uma conquista pessoal e vem do exercício diário da vontade de melhorar. A vontade de melhorar deve estar acompanhada de um estudo frequente da Língua Portuguesa, ainda mais agora que passou recentemente por mudanças em sua estrutura. Outra autora, a jornalista Thais de Mendonça Jorge, no seu livro “Manual do Foca”, alerta para a necessidade de o repórter ter bagagem cultural (que mais uma vez vem pelo estudo permanente), e ter domínio do português.Outro tipo de falha comum - e preocupante -, é a falta de especificação da fonte de informação. Muitas vezes o estudante refere-se somente à profissão da fonte, de maneira generalizada. Classifica uma fonte como psicóloga, outra como médica, outras como professora, cabeleireiro e administrador de empresas. Nos textos publicados este semestre no jornal Matéria Prima observa-se que ainda não há preocupação com o domínio que a fonte escolhida para a entrevista tem sobre o assunto em questão. Esse cuidado é o que torna a informação muito mais rica, precisa e, consequentemente, mais legitima. Luiz Costa Pereira Júnior, ao parafrasear Nilson Lage, no seu livro “A apuração da notícia”, diz que o público deve receber tanta informação quanto possível sobre a confiabilidade de uma fonte. Deve haver preocupação em achar fontes que tenham um trabalho o mais específico possível com relação ao assunto do qual se trata. Nem todo médico pode responder questões sobre a saúde e nem todo psicólogo pode responder sobre o comportamento humano em casos variados.O cuidado com a escolha das fontes de informação deve começar aqui, enquanto ainda se é estudante de jornalismo. Com isso, o futuro jornalista passa a ter discernimento e saberá diferenciar bem informação verídica de mera manipulação.